E este senhor chama-se Alberto Gonçalves, é sociólogo e cronista no DN e na revista Sábado.
Sou um ávido leitor das últimas páginas da Sábado onde as suas crónicas são impressas. Normalmente leio as crónicas do mesmo modo que vejo o Family Guy, ou seja, entretêm-me e rio-me sem ter muito em conta o autor apesar das constante pancadas que dá a elementos da sociedade.
Contudo, hoje tive oportunidade de ler a crónica intitulada
"O Hip Hop também mata" que está no site do DN e dei por mim a indagar se este senhor seria o filho desaparecido do Pacheco Pereiro, tais são as parecenças de feitio no que toca à arrogância e elevação de "senhor-de-toda-a-razão". Se um é cronista e o outro também, se um é sociólogo e o outro ninguém sabe muito bem o que faz da vida, e se ambos escrevem e falam como deuses, então só podem ser ligados por sangue real.
A crónica refere-se à morte de Nuno Rodrigues, baleado na semana passada por um polícia durante uma perseguição policial. Nuno Rodrigues, ou MC Snake, era um músico emergente no hip hop português, companheiro de viagens de Sam The Kid, residente em Chelas e já tinha estado preso por tráfico de droga. Para um mortal simples, estes factos servem para criar uma imagem estereótipada de que Nuno Rodrigues era um criminoso negro que "deve ter feito algo para provocar a reacção da polícia". Consigo compreender que essas pessoas simples tenham essa imagem do Nuno e de muitos outros, porque na verdade as suas limitações culturais, sociais, políticas não lhes permitem evoluir no que toca a representações mentais. São pressupostos que a mente cria porque não tem capacidade para mais.
Contudo, o caso de Alberto Gonçalves é ligeiramente diferente.
Aparentemente, e digo isto, porque não o conheço pessoalmente nem profissionalmente, o senhor é sociólogo portanto depreendo que tenha tirado um curso superior onde adquiriu conhecimento tácito e formou a sua personalidade. Assim sendo, fico um pouco, vá lá, estupefacto com frases como "É, vá lá, um estilo de vida, traduzido à superfície no vestuário ridículo e nos gestos animalescos. E nas letras das "canções" (?). As letras, que certa "inteligência" considera "poesia das ruas", são, além de analfabetas, manifestações de rancor social. Por norma, são também glorificações do crime e panfletos misóginos." Isto é a interpretação de hip-hop para Alberto Gonçalves. Mas temos mais momentos fantásticos como: "Vale a pena lembrar que, em tempos realmente opressores, os pretos inventaram o jazz, um dos maiores contributos da América para a humanidade. E vale a pena lembrar o exemplo de Louis Armstrong, um génio que os "radicais" achavam o paradigma do "traidor". Tudo porque, tendo sofrido na pele a discriminação, Armstrong preferiu combatê-la pelo talento e não agravá-la através de inanidades gritadas por cima de uma caixa de ritmos.
Obviamente, o hip hop é principalmente uma invenção das indústrias discográfica e televisiva, e não traria mal ao mundo se o mundo não se deixasse influenciar por semelhante patetice."
Frases como esta demonstram que Alberto Gonçalves é um limitado intelectualmente, musicalmente e históricamente. Afirmar que o hip-hop é um produto fabricado pelas indústrias discográficas é o mesmo que dizer que tudo é o que é música é fabricado por grandes empresas para o consumo das massas, desde música clássica ao heavy metal. Depois, resumir a morte de uma pessoa à cor da sua pele, ao local onde nasceu ou à música que faz só demonstra que tem uma visão completamente fechada da sociedade. Pergunto-me se tivesse sido um branco a ser baleado, vestido de calças bejes e sapatos de vela se o título da crónica seria " Mafalda Veiga também mata.". Resumir o hip hop e os seus intervenientes a um conjunto de estereótipos pré-concebidos e sem fundamento fica mal a um "sociólogo".
O seu texto dá-me a sensação de que as coisas que saiem fora da caixa de gosto de Alberto Gonçalves são inúteis e negativas. Ele gosta de azul, mas eu de vermelho? Conclusão: Sou uma merda. Ele usa cabelo para o lado, eu uso o cabelo esgadelhado? Conclusão: Sou um vagabundo.
Se os familiares do Nuno Rodrigues conseguiram guardar a mágoa, com atitudes de louvar, o contrário não se pode dizer de Alberto Gonçalves ao incendiar um acontecimento grave com opiniões não fundamentadas e pouco construtivas, e até, ofensivas.
Termino ao dizer que sou branco, com um curso superior, que ouço hip-hop, que não sou fã acérrimo mas que me interesso pela cultura e história de um estilo musical que muito ajudou as comunidades negras a alcançarem o mesmo estatuto que as brancas. Para fazer isto, não preciso de usar vestuário ridículo e fazer gestos animalescos. Basta-me querer ser culto e não acéfalo.